segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Entre a dança e a fúria


"Em primeiro lugar, minha literatura é uma missão: defender o povo e a cultura brasileiros. Em segundo, uma vocação. Não acredito em literatura sem vocação. Em terceiro, é uma festa. Passei por momentos muito duros na vida, mas os enfrentei pela minha arte, que é a minha dança. Eu sei que posso ficar cego, porque sou diabético - mas eu danço. Quando eu digo dançar, quero dizer que participo da festa da literatura. A morte é certa. Todos nós morremos - e eu danço mesmo assim. A tarefa de viver é dura, mas fascinante. Agradeço a Deus o fato de viver. É com estas três palavras que eu danço: missão, vocação e festa."

Soa como um epitáfio - belo, feliz e estimulante epitáfio para nós que estamos na travessia da vida - este  trecho da entrevista que o escritor Ariano Suassuna deu ao jornal O Globo, publicada na edição desse domingo. É algo que ressoa fundo aos olhos de quem, ao ler as palavras do homem, reconhece nelas o poder revelador de sua literatura. Contém a um só tempo uma profissão de fé na literatura que cabe tanto ao escritor quanto ao seu leitor e uma entre as inúmeras - e sempre nunca suficientes - definições do que vem a ser a vida.

Shakespeare tem aquela tão célebre quanto sombria, que cai bem aos olhos de quem enxerga a vida por baixo de uma camada de poeira triste: alguma coisa com um monte de som e de fúria que não faz sentido algum. Aqui do meu observatório situado em algum pico de uma das montanhas seridoenses, no silêncio de lugares dos quais o mundo não toma muito conhecimento, a preferência mira muito mais nos sítios onde reside a percepção de um bem mais próximo Ariano Suassuna. O paraibano de Soledade - portanto, seridoense paraibano como a gente desses picos - que a vida tornou pernambuco e a literatura transformou em universal tem mais olhos para a beleza oculta no homem e na natureza do que o bardo ocidental de todo o sempre. As escolhas estão aí, à disposição de nossas decisões perceptivas. Podemos até errar, mas nunca dizer que não tivemos as palavras iluminadas para nos guiar no caminho dos mistérios do encanto ou da decepção.

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