segunda-feira, 21 de julho de 2014

A liberdade do cinema



Viva a Liberdade, o filme, chega a ser brilhante no prodígio da situação que constrói e nos resultados que tira dela. 

Na tela, um líder político correto e ponderado que não empolga é substituído em momento de crise pelo irmão gêmeo tão provocador quanto irresponsável - e divertido, é lógico.

Pena que os resultados, na tela – na vida? – não ultrapassem a barreira da verbalidade.

O filme é por isso mesmo um  manual de novas citações para a velha crise política de meio mundo: “O medo é a música da democracia”, a mais impactante, é apenas um dos acordes dessa trilha sonora.

A tela reluz em momentos assim, quando o tresloucado irmão gêmeo em pane psiquiátrica “do bem” formula com simplicidade nem um pouco política o impronunciável. Direto ao ponto, pois que sem amarra alguma – leia-se, consequências complicadas de serem resolvidas fora de um filme. Para isso serve o cinema, a literatura e outros irmãos da mesma família.

Mas como assistir a isso sem lembrar o comediante que virou azarão na última grande eleição italiana – ou será espanhola, que o borrão dos impasses políticos e econômicos da zona do euro amarrota tudo como se fora um papel amassado?  

Como não lembrar de uma outra figura do mundo real – Dario Fo, que em esquete semelhante escapou da dramaturgia e foi parar nos ringues da política italiana?

Não tem também como não pensar numa outra líder, de um país distante, em momento de ataques de popularidade: e se uma gêmea da Dilma, mais serelepe e sorridente, fosse posta para representá-la em campanha, enquanto a autêntica toma uns sais num spa recomendado por Michel Temer?

Hum, não... pensando bem, se há algo que a Dilma de verdade já contém é essa falta de freios em, aqui e ali (poderia ser mais frequente, não?), disparar aquela frase entre mal educada e certeira, desconcertando a hipocrisia que a cerca.

Lembro apenas de uma: “Sou uma mulher cercada de cavalheiros”, cujas palavras exatas obviamente não são essas que empreguei mas cujo sentido caminha na mesma direção. Para exatidões, basta um clique no Google.

O filme, portanto, no Brasil ou na Itália, não é apenas um filme. Mas tem a seu favor as facilidades da criação.

Pior para os europeus, que nem com uma fictícia figura dessas – o irmão gêmeo idêntico na forma e surreal na performance – podem contar.

Também é uma pena que, brilhantismo verbal à parte, da metade para o final a parábola cinematográfica não se sustente tanto. Repare mesmo como o impacto vai embora justo na cena que deveria ser seu auge: aquele discurso que, se por descuido fosse parar numa fita americana, já estaria sendo chamada de “cena do Oscar” – e com razão.

Mas o que já se viu já valeu, tamanho o poder da provocação política que este Viva a liberdade constrói.

(E atenção para o diálogo que o desembestado falso líder tem com um apressado jornalista. Serve para bem além das folhas e dos telejornais italianos.)

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