quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Imagine se fosse aqui


O cidadão mais rico do planeta sai de casa pra votar e tudo o que encontra são filas. Na zona eleitoral mais abastada do planeta, máquinas de votar movidas a perfuradores medievais que...dão tilt. Na ilha mais platinada da galáxia, o "sistema", acredite, também fica fora do ar. E em lugares mais remotos, embora ainda nos domínios do país mais opulento da via láctea, aparelhos de votação promovem fraudes: você - você não, que é brasileiro e está fora dessa bagunça; eles, os americanos - vota em Obama e a máquina converte sua escolha para... como é mesmo o nome do perdedor? Ou faz o contrário. A ordem dos fatores não importa tanto quanto o efeito em si da fraude operada.  Tudo isso a gente leu nos jornalões ao longo do noticiário sobre as eleições americanas. Sempre, o tempo todo, gritando, implicando ao pé do ouvido, uma variação daquela perguntinha que de tão chata já vai virando piada - o destino de toda implicância associada ao exagero: "imagine se fosse no Brasil".

Se você é do tipo que lê jornal com a tevê ligada, é capaz de ter tido sua leitura atropelada por um muito interessante anúncio de televisão, daqueles que conseguem captar, mais do que qualquer jornalista intelectualmente superequipado, o espírito do momento. Ou, no caso, do futuro - o que é ainda mais difícil: o anúncio da cervejaria Brahma que se diverte em contestar, argumento por argumento, toda a campanha de senso comum sobre o desastre que será a Copa no Brasil, o eterno despreparado. Os anúncios da cerveja rebatem a autodepreciação de quem se julga superior ao país onde vive com afirmações enfáticas e antropologicamente elementares: teremos aeroportos cheios, sim, de torcedores animados; ruas congestionadas também, de brasileiros e estrangeiros vivendo a festa do campeonato. Um colunista na revista Época já havia dito o mesmo, contrariando meio mundo e o resto do que se escreve nessa publicação da editora Globo: que a Copa vai ter sim seu componente de bagunça brazuca, mas que ainda assim será a mais calorosa que já se viu, num evento que poderá até não ter o rigor planejado de um campeonato em terras alemãs, por exemplo, mas vai encantar os estrangeiros com as compensações que temos, como povo e nação, a oferecer em troca. Claro que ele disse tudo isso com outras palavras, mas o sentido era por aí. 

E no entanto não se lê, nas páginas do jornais, nenhum jornalista tendo ataques de indignação diante do sistema eleitoral que rege (?) a votação que escolhe o presidente dos zéua. Aquela síndrome do "a gente não sabermos escolher presidente / a gente não sabemos nem escovar os dentes" que soava divertida nos anos 80 e hoje é só um eco do conservadorismos de rockeiros saudosos da fama jamais é aplicada a qualquer nação do dito primeiro mundo. A gente fala grosso pra denunciar nossas mazelas de estimação, mas não temos gogó algum quando se trata de ficar pelo menos perplexos diante das filas que enfrentaram para votar em Mitt Romey os ricaços de Manhatan, do sistema fora do ar que trucidou a paciência dos velhinhos de Nova York Citi, dos cowboys do interiorzão americano que votaram num candidato só para a máquina registrar a escolha do outro. Imagine se fosse no Brasil. Imagine.

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