terça-feira, 19 de junho de 2012

Rio + 20 é no sertão


No recinto, o conforto do ar condicionado e da poltrona macia. Lá fora, por trás da vidraça tipo cinemascope, o paisagem da cidade dadivosa. Do ladinho, um batalhão de assessores prontos a tropeçar ao menor pedido do mais reles copo de água - bem pura, por favor. E ainda tem quem estranhe que a nova edição da Conferência Mundial do Meio Ambiente, publicitariamente chamada de Rio + 20 (um nome que vale por uma tuitagem rapidinha), não apresente resultado. O problema é o ambiente. O problema é climático. Entendam bem: a referência não é exatamente aos problemas do planeta, mas da conferência mesmo. Quem for capaz de suar um milésimo da inhaca exalada por qualquer bom brasileiro durante um janeiro nordestino vai achar a solução para todos os impasses assim-assim, num passe de racionalidade. 

Está claro como o buraco da camada de burrice que recobre o planeta: bastava instalar a conferência num lugar menos aprazível do ponto de visto pop-ambiental. Bastava trocar o que (não) está sendo a Rio + 20 por alguma coisa como o Sertão - 10 (como aliás já sugere uma dessas piadas compartilhadas no Facebook). Imagine se a Rio + 20 (ok, por questão de convenção, vamos manter o nome) fosse realizada num pavilhão no interior da Bahia, com essa seca causticante que vem marcando com suas úlceras o sertão nordestino, num pavilhão coberto com telhas brasilit? Ou então num acampamento de barracas de lona nas margens do leito seco do rio Seridó, na região que leva este nome no interior do Rio Grande do Norte - um estado ainda melhor, visto que nem precisaria mesmo trocar o nome da conferêcia? Não preciso nem falar das opções mais, digamos, globais - como os rincões mais hostis das savanas africanas, preciso? Alguém duvida que, instalados em cadeiras dobráveis de bar, dessas invariavelmente pintadas de vermelho ou amarelo e com um Brahma bem grande pintado no tampo, tendo que se valer de precários ventiladores angariados na vizinhança, os senhores chefes de Estado não chegariam rapidinho a um consenso sobre o que precisam de fato mudar para que a Terra velha de guerra não vá a pique em função dos nossos desmandos comuns (sempre lembrando que neste grupo, como sempre, tem uns mais comuns do que outros)?

Li num desses romances populares sobre os bastidores do Vaticiano, um desse Morris West que é preferível não citar pra não passar vergonha, que durante a eleição do papa os senhores cardeiais reunidos em Roma são alimentados com um café terrível e mantidos trancados em condições não muito confortáveis. O objetivo é exatamente fazer com que não demorem muito a escolher o novo ocupante do trono de São Pedro. Pois é precisamente isso o que falta na Rio + 20, ainda mais tratando-se de uma conferência que não trata sobre algo etério e subjetivo como a definição sobre qual ser humano, entre tantos habitantes do planeta, está mais apto a servir como embaixador de Deus no plano dos depredadores aqui embaixo. Não, na Rio + 20 trata-se do planeta propriamente dito - e o dono da representação diplomática situada no país da bota  não tem nada a ver com o basquete. Aqui, os homens que se atem e se desatem, se quiserem continuar tendo onde morar. Pois até do ponto de vista metalinguístico, o sertão precário - precário mesmo, sem as facilidades que a tecnologia, essa danada, trouxe para lugares como o país do Seridó - é o lugar ideal para o pessoal que dá as ordens sentir o drama e não decidir com base apenas na suposição apressada dos assessores igualmente mantidos confortavelmente à margem do verdadeiro meio ambiente, aquele que queima sob o sol, fustiga com o vento, encandeia com a claridade, afoga na enchente e mata de sede e fome quando vem a seca.  

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