Este ano, vamos cobrar uma velha dívida dos cariocas
Os cariocas são minha última
esperança. O verão carioca. Os modismos do verão carioca. Nunca eles foram tão
necessários - porque ousados, irreverentes, loucos e irresponsáveis. É disso
que a família brasileira mais precisa agora, nesta triste reta final não apenas
de um ano, mas de uma série deles ao longo dos quais fomos atingidos por
péssimas notícias encadeadas, ondas de intolerância compactadas e um bafo de
atraso como jamais imaginamos. Pois ninguém melhor do que os cariocas para dar
um chega pra lá nisso aí.
E eles nos devem isso: durante anos,
décadas, séculos, fomos obedientes e fiéis seguidores das invenções que os
cariocas nos traziam a cada verão: teve o do topless, o da lata, o do primeiro
Rock in Rio, o do "Carnaval no fogo", que foi tão bom que virou
livro, com esse título aí, escrito por Ruy Castro. Se durante tanto tempo fomos
leais súditos dos verões cariocas mesmo morando a quilômetros de distância - em
lugares onde havia outros modismos mas sem a menor chance de concorrer com
aqueles propagados pela máquina de informações que vinha do Jardim Botânico, o
bairro - então não será abuso nenhum cobrar a conta agora.
É assim mesmo: contas se cobram em
momentos difíceis, quando tá todo mundo por um fio. E nesta hora em que nossa
malemolência tropical está sendo ameaçada como nunca imaginamos pela rigidez de
pastores milionários ou aspirantes a tanto, por arremedos de políticos que
tisnam uma atividade que originalmente é das mais necessárias e por
subcelebridades que não se conformam com o anonimato depois de famas fúteis justo
naqueles libertários anos 80, então vamos passar a régua e exigir a
conta: cariocas, ao trabalho, já – que dezembro está estourando aí.
Que nos apresentem, como
contrapartida a tanta agressividade autorizada, burrice proclamada e moralismo
de ocasião um verão escandaloso, performático, fútil como tem que ser mas
divertido como se espera – numa palavra, bárbaro, para espantar os caretas de
uma vez.
Um verão selvagem é o que pode nos
salvar – ou, pra também não falar em termos tão definitivos que de fato não combinam
com a estação – ao menos deter um pouco o neonazismo brazuca como um bloco de
carnaval que para o trânsito impaciente da avenida Presidente Vargas.
Então, cariocas, vocês nos devem um
baita de um verão. Usem o que for preciso: um novo biquíni, um point
inesperado, um movimento que coloque aquela gente toda na praia diante de um
adversário comum (apitos sempre podem
ser recuperados), o Cristo, o calçadão, Leila Diniz, a Rocinha, a Globo, o
diabo. Mas nos entreguem aquele verão atrevido, barulhento e determinado a
fazer a diferença que fez valer ao Rio a fama de capital cultural de um país em
ruínas.
Kkkk. Muito bom.
ResponderExcluirParabéns pelo novo Sopão do tião, com textos que precisamos ler todos os dias
ResponderExcluirRomário, do site www.brasiliarios.com