terça-feira, 23 de agosto de 2016

Me debato no debate




Pra curar a ressaca dos shows olímpicos, nada como o debate eleitoral pela prefeitura de São Paulo

Eu não tenho nada a ver com isso. Não moro em São Paulo. Só estive nessa cidade pouquíssimas vezes, e sempre de passagem. Perdi 80 por cento do meu interesse, digamos, “eleitoral” pela política – embora, numa visão menos apressada, seja quase impossível não se posicionar politicamente diante de um país tão errático, admito. Enfim, não havia motivo algum pra acompanhar o debate entre os candidatos a prefeito da maior cidade do país e da América do Sul na noite dessa segunda-feira.

Mas o chrome cast estava ali à mão, eu tinha lido sobre o debate nos jornais do dia (o que sempre é uma isca, a leitura dos jornais, pra uma série de outras coisas), tinha curiosidade por ver como se posicionaria a Marta ex-PT. E também queria conferir como o modo-de-estar-no-mundo estilo almofadinha de Dorinho Júnior funcionaria, ou não, no embate de uma campanha eleitoral. Enfim, assisti ao debate.

Primeiro, fiquei quase deprimido. Não com os candidatos. Nem mesmo com o Major Olímpio – que me alegrou imensamente por proporcionar a visão do quanto o cafajestismo político da era do impeachment de Dilma soa mal num programa de tevê desse tipo (sim, porque antes de mais nada, eleição à parte, debate eleitoral é puro programa de tevê; precisa sobretudo entreter, caso contrário não cabe no modelo que caracteriza historicamente a televisão brasileira, e é incrível que muita gente que trabalha em tevê ignore isso).

Piedade

Retomando, por que eu fiquei deprimidão? Na medida em que os problemas da cidade de São Paulo iam sendo desfiados qual uma renda amaldiçoada que fosse estendida sobre a metrópole e seus incautos habitantes, eu passei a sentir uma imensa empatia com essas agoniadas pessoas. Meu Deus, tende piedade: como é ruim morar em São Paulo, especialmente se você é pobre – estatisticamente pobre, que fique claro.

Quanta mazela, lerdeza, obstáculos, provações urbanas. Eu no lugar de um candidato qualquer daqueles aproveitaria pra engatar um choro teledramático captador de milhões de votos, porque motivos não faltavam. Não existe vida minimamente regular, tranquila, reta, banal em SP, Criolo Doido? Junte trânsito, bicicleta, CEU, ciclovia, saúde pública ruim, escola com ou sem aprovação automática, faixa exclusiva, faixa de atropelamento, reserva de ar ou poluição para todos, parece que nada tem jeito, tudo está perdido. Não é possível, isso tudo só pode ser praga de Jânio Quadros, embora digam que antes dele a coisa já não era das melhores. Porque não foge todo mundo pra... Pirajú, por exemplo? Tem uma represa massa, neblina e sombra nas noites de julho, uma beleza. E fica perto. Deixa pra lá.

Quem ganhou o debate? O Diabo, em pessoa. Uma espécie de diabo urbano que se infiltra das cracolândias aos pancadões, pegando só de maldade os moradores dos jardins e morumbis azumbizados pelo cerco inevitável. É impraticável manter o bom nível de um debate em meio a tanto caos, mas como no Brasil tudo é possível – e em São Paulo mais ainda – o fato é que ao final todos sobreviveram. Até o Major Olímpio, com sua bela contribuição já citada aqui, mostrando o quanto o primarismo político pode soar grotesco.

Marta me surpreendeu pela naturalidade bem articulada – o avesso do avesso do avesso de Dilma – que usou até pra transformar confissão de erro em autoelogio possível. Dorinho Júnior foi aquele tatibitate de condomínio enfeitado com plantas de plástico – surpresa alguma, o que no caso dele não deixa de ser esclarecedor para o eleitor em geral. Gostei de Haddad, que manteve uma tranquilidade meio cabeça erguida mesmo servindo de pau de sebo pra tanto marmanjo (Marta incluída, porque política não tem sexo, né, pessoal?).

Faltou alguém...? Ah, Russomano, claro, que pra mim... ele estava mesmo lá? Não notei muito a presença do campeão das pesquisas. Mas como é que o mais atacado, lá embaixo nas pesquisas – Haddad – até que se sobressai enquanto o favorito parece ter no máximo mandado um clone inexpressivo pra representá-lo? Elementar, meu caro Caetano: estamos em Sampa; aquele lugar politicamente de pernas para o ar onde tudo pode acontecer e cuja prefeitura qualquer um pode ganhar. Independente da lógica, da história, dos argumentos, das posições políticas e, por que não, dos debates.

*E a irracionalidade política chegou a tal ponto que nem me dei conta da ausência de Erundina. Amigos no Facebook me chamam atenção para isso. Se eu não notei, magine o grosso do eleitorado. Triste baía aterrada de Piratininga.

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